7th Ave

by - 03:29


A porta se fechou com um barulho oco que vagou pelo cômodo mudo.
Não havia nada para se falar por mais que o silêncio implorasse por palavras. A janela espessa continha os sons da metrópole que nunca descansava enquanto apenas o murmurar do ar condicionado preenchia o quarto que, até alguns instantes atrás, estava deliciosamente quente. Abafado. Palpável.
O frio lençol arrepiava sua pele de uma maneira deliciosa, era refrescante. Naquele momento ela se agarrava àquele pequeno carinho. Queria o toque de dedos, o ofegar de uma respiração em seu ouvido, a intensidade contida em um olhar que não queria desviar. A cama não deveria ter ficado tão fria como naquele momento. E ela não podia se sentir tão gélida.
 Pensou que se fechasse os olhos naquele exato momento e tentasse escutar com atenção, poderia captar o tímido barulho de passos se afastando pelo carpete do enorme corredor. Mas não conseguiu. Ele já estava longe dali. Poderia ter sido mais uma despedida, ela pensou, não gostara do modo como disseram adeus.
Com os olhos bem abertos, a cabeça se recusava a deixar aquele cômodo. Ela tinha certeza que deveria estar agitada, se estivesse em seu estado normal, sua mente com toda certeza estaria trabalhando furiosamente, analisando cada segundo daquilo que tinha acontecido ali. Se estivesse sã, talvez não estivesse tão calma. A verdade é que ela nunca se sentira tão em paz na vida. Sabia que esse sentimento não duraria muito, mas naquele momento poderia aproveitar a quietude que acariciava seus pensamentos.
Pelo chão estavam algumas peças de roupa, jogadas ali, prontas para serem esquecidas ao primeiro olhar mais furtivo.
Não demoraria muito para o dia amanhecer, mas ainda era cedo. Bem cedo. Alguns tímidos feixes de luz entravam pela densa janela do quarto de hotel, quase como se quisessem tocar o que o pouco que o lençol não cobria.
Ela queria se sentir suja, afinal, era assim que deveria se sentir, não é? Tinha passado a noite com um homem que provavelmente nunca mais iria reencontrar, por mais que seu coração se apertasse um pouquinho com aquele pensamento. O mais novo “antigo estranho” nem sequer passaria o resto da noite com ela e ela acordaria na companhia de uma cama vazia. Isso se conseguisse dormir. Deveria se sentir suja e um tanto quanto vulgar, mas não conseguia.
O travesseiro escondeu parte do sorriso que tomou conta de seus lábios. Ela se sentia bem. Muito bem. Nostálgica, pensativa e um tanto solitária enquanto tentava entender a avalanche de emoções que percorreu seu corpo depois que escutou a porta se fechar. Mas bem. Como há muito tempo não se sentia.
Não podia comparar aquela emoção com qualquer uma que suas lembranças jogassem para ela. Poucas vezes havia sentido tanto em tão pouco tempo. Era um tanto quanto cômico pensar que ela esperou tanto tempo para sentir tudo aquilo e que tivesse durado apenas algumas horas. Ela pediu e o destino lhe deu, mesmo que fosse apenas por um instante. Irônico, ela pensou. Às vezes a vida pregava essas peças.
Não havia estabelecido um tempo, não enviou um pedido formal para Deus ou quem quer que estivesse fazendo tudo aquilo acontecer. Não podia simplesmente voltar atrás em seu pedido e acrescentar: “ah, quero que dure dias, semanas, quero algo duradouro!”. Ela conseguiu o que queria e não podia reclamar. Foi curto, foi. Mas ah, como foi bom. Nem sabia o quão vazia estava se sentindo até se sentir tão viva, tão cheia de si. Em si.
Rolou para o outro lado da cama e inspirou o cheiro de um estranho nem tão estranho assim. Pelo menos ele não parecia tão inalcançável assim. Alguns flashbacks tomaram conta de sua mente e ela, mais uma vez, não conseguiu domar o sorriso que tomava sua boca.
Não queria pensar no depois, não queria pensar que a qualquer momento seu despertador tocaria e ela teria que ir embora dali. Naquele momento ela só queria ficar onde estava, se deixar absorver por tudo aquilo que poderia ser e não foi. E o que foi e acabou. Tão inesperadamente quanto aquela situação a agarrara, ela teria que bolar um plano para o amanhã. Ela ainda não estava preparada para se despedir do ontem.
Naquele momento ela podia se permitir fechar os olhos e reviver algumas cenas até que elas estivessem impregnadas na sua mente. Naquele momento ela se daria ao luxo de pensar que a manhã seria mais fácil, que ela conseguiria seguir em frente sem muitos problemas. Naquele momento ela era dona de si mesma, por mais que um pedacinho tivesse sido levado assim que aquela porta se fechou atrás dele. Naquele momento, tudo estava bem. Estranho, diferente, inesperado. Mas bem.
Ela sabia que assim que acordasse teria que abandonar aquela cama, por mais que cada fibra de seu ser gritasse para que ela ficasse mais um pouquinho.
Com um suspiro cheio de significados intangíveis, se virou e, se esparramando na cama, abraçou o outro travesseiro. Se ela tinha que dormir sozinha naquela noite, que pelo menos fechasse os olhos enquanto inspirava o cheiro daquele que permaneceria em seus pensamentos por algum tempo.
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